terça-feira, 10 de novembro de 2015

Comecei a te amar no dia em que te abandonei .

Foram as palavras dele quando , dez anos depois , a encontrou por mero acaso no café . Ela sorriu , disse-lhe "olá , te amo" mas os lábios só disseram "olá , está tudo bem ?" . Ficaram horas conversando , até que ele , nestas coisas era sempre ele a perder a vergonha por mais vergonha que tivesse naquilo que tinha feito (como é que fui te deixar ? como fui tão imbecil a ponto de não perceber que estava em você tudo o que queria ?) , lhe disse com toda a naturalidade do mundo que queria levá-la para a cama . Ela primeiro pensou em esbofeteá-lo & depois amá-lo a tarde toda & a noite toda , em seguida pensou em fugir dali & depois amá-lo a tarde toda & a noite toda , & finalmente resolveu não dizer nada & , lentamente , escondendo as lágrimas por dentro dos olhos , abandonou-o da mesma maneira que ele a abandonara uma década antes . Não era uma vingança nem sequer um castigo — apenas percebeu que estava tão perdida dentro do que sentia que tinha de ir para longe dali para ir para dentro de si . Pensou que provavelmente foi isso o que lhe aconteceu naquele dia longínquo em que a deixara , sozinha & esparramada de dor , no chão, para nunca mais voltar .

De tudo o que amo é você o que mais me apaixona .

Foram as palavras dela , poucos minutos depois , quando ele , teimoso , a seguiu até o fim da rua na hora do rush . Estavam frente a frente , todo mundo passando sem perceber que ali se decidia o futuro do mundo . Ele disse : "Casei-me com outra para poder te amar em paz" . Ela disse : "Casei-me com outro para que houvesse um ruído que te calasse em mim" . Na verdade nem um nem outro disseram nada disso porque nem um nem outro eram poetas . Mas o que as palavras de um ("te amo loucamente") & as palavras de outro ("te amo loucamente") disseram foi isso mesmo .

A rua parou , então , diante do abraço deles .

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